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    No princípio foi o berro.

    Os olhos tristes dos bois espiaram longamente as várzeas que se estendiam pelas margens do Acaraú, acaracú dos tapuis, morada de acarás ou rio das garças, que muitas são as versões para o batismo do rio. Os bois berraram nos sertões, cascos abrindo caminhos por terras dantes nunca pisadas, boiadas carregando atrás de si as […]

    Os olhos tristes dos bois espiaram longamente as várzeas

    que se estendiam pelas margens do Acaraú, acaracú dos
    tapuis, morada de acarás ou rio das garças, que muitas
    são as versões para o batismo do rio.
    Os bois berraram nos sertões, cascos abrindo caminhos
    por terras dantes nunca pisadas, boiadas carregando atrás
    de si as fumaças da nobreza europeia, cavaleiros medievais
    vindos de Portugal para se embrenhar nos sertões,
    tangendo gados, carregando atrás da poeira dos cascos as
    suas mulheres, seus filhos, a escravaria e todos os seus
    teréns, novos cruzados na conquista de um mundo novo.
    Devem ter sido os bois os primeiros estrangeiros
    a beber das águas dessa ribeira; foi o casco do boi
    o grande colonizador desses sertões, seus grandes
    olhos tristes, como já se disse, se espraiando pela lonjura
    das matas, enxergando a Meruoca mais além.
    Sobral é filha legítima daquilo que o historiador cearense
    Capistrano de Abreu tão bem chamou de civilização do couro.
    Foi das fazendas de criar, pouco mais que toscos
    ranchos nos seus primórdios, que os brancos foram
    alargando terras e poder, terras e escravos, terras e
    dinheiro, terras e por fim cidades.
    Não foi diferente na Caiçara, privilegiado ponto da
    ribeira, água farta e boa, pastos abundantes, tudo
    necessário para próspera fazenda.
    Não demorou muito para que de fazenda de criar
    se passasse à Vila, que interessava a el- Rei povoar
    suas terras, e ribeira como essa era das mais férteis
    e importantes da província.
    Vila Distinta e Real de Sobral, por ordem régia de
    5 de julho de 1773. Distinta porque não surgiu de
    aldeamentos indígenas; real porque criada por ordem
    emanada diretamente de sua majestade.
    Nasceu orgulhosa a Vila de Sobral, de um orgulho
    que ao longo de séculos transformou-se no sentimento
    que hoje se diz sobralidade, que fez da meia
    dúzia de taperas das beiradas dos Acaraú a importante
    Princesa do Norte.
    Foi da pequena vila que se espraiou o brasão real,
    representando pela autoridade maior, homem do rei,
    Capitão- Mor da ribeira do Acaraú, José de Xarez
    Furna Uchoa. Quem hoje vê a quase choupana
    onde residia o Capitão- Mor custa a crer que tivesse
    ele tanto poder, senhor de baraço e cutelo, que
    de Paris trouxe o café e o introduziu no Ceará, na
    Serra da Meruoca.
    Sobral nasceu daí, parada pelas boiadas, mais importante
    elemento da economia colonial na região.
    A presença da pecuária marcou por séculos a cidade,
    permanecendo ainda hoje sua forte influência
    na arquitetura, nos costumes, nas artes, na vida
    do povo.
    O pequeno arruado cresceu, buscando se impor, primeiro,
    em pedra e cal, para depois revelar seu prestígio
    e poder político, entre os mais importantes centros
    da província, disputando com o Icó e o Aracati
    a primazia econômica e política do Ceará.

     

    Livro: Sobral Solar
    Prefeitura Municipal de Sobral- Secretaria da Cultura e Turismo
    Texto Principal- Autor: Joan Edessom de Oliveira
    Organizado por Patricia Veloso
    Editora: Terra da Luz Editorial
    Fortaleza, 2014

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