A história da inteligência brasileira nos fornece pistas para a compreensão sobre como se formou o ponto de vista autóctone do homem brasileiro, sua visão sobre o mundo e sobre si próprio, ou ainda, resumidamente, sua consciência de povo-nação.

Pretendemos, com este trabalho, chamar atenção para a importância do estudo das origens da cultura brasileira, fornecendo, ainda que de forma abreviada, indícios para o que poderíamos denominar uma arqueologia da consciência nacional.
Nossa tentativa será a de resgatar os fundamentos gnoseológicos da mundividência do povo brasileiro, originada sobre a égide daquilo que, em nível mundial, ficou conhecido como cultura barroca.

Traços Gerais da Cultura Barroca

Definir a cultura do período Barroco não é tarefa fácil. As diversas teorias existentes sobre o fenômeno nos fornecem desde já um testemunho de sua complexidade. Em linhas gerais, e a título de uma introdução ao assunto, podemos dizer que o Barroco é um “método de pensar e sentir” (1), o que equivale a dizer que é uma cultura, caracterizada, em última instância, por reagir aos valores clássicos do Renascimento não através de sua negação, mas através de sua incorporação em uma nova cosmovisão.

Mas de onde provém essa cosmovisão? Quais seus condicionantes infra-estruturais? E, mais que isso, por que irrompe de uma forma tão avassaladora em tantos lugares, de Portugal à Alemanha, do Brasil ao México, com tamanha abrangência e regularidade, apesar da diversidade de formulações que dela tiveram as diversas sociedades? A essas questões não podemos responder sem a devida consideração de alguns aspectos sócio-econômicos e políticos que marcam o período do Barroco.

Em primeiro lugar, é necessário ter na conta devida que o Renascimento não foi um movimento tão uniforme e nem tão abrangente quanto o Barroco. De forma geral, acudiu-o de suas profundas dissonâncias internas e de suas dissidências nacionais o conceito de “clássico”, que trazia por trás de si uma idéia de ordem, de clareza, de linearidade, e, enfim, de confiança nas possibilidades da Ciência e da Razão, abertas com a expansão mercantil, com o desenvolvimento da técnica e com o florescimento de uma sólida cultura urbana.

Trata-se de período marcado por salto espetacular no desenvolvimento das forças produtivas. A acumulação primitiva realizada através do comércio preparara terreno para o surgimento da manufatura e, portanto, de centros urbanos onde fervilhava um pensamento de otimismo e crença nas potencialidades do Ser Humano.

Os fundamentos da visão de mundo do povo brasileiro foram originados sob a cultura barroca

“A Terra foi, então, realmente descoberta, lançando-se as bases do futuro comércio mundial, bem como a transição do artesanato à manufatura, que foi, por sua vez, o ponto de partida da moderna grande indústria. Foi atenuada a ditadura espiritual da Igreja. Os povos germanos repeliram-na, em sua maioria, tendo adotado o Protestantismo, enquanto que, entre os povos latinos, estabeleceu-se uma alegre liberdade de pensamento, imitada dos árabes e alimentada pela filosofia grega” (2).

A “alegre liberdade de pensamento” à qual alude Engels é o maneirismo que preparava terreno para o surgimento – primeiramente entre os países ibéricos – do fenômeno da cultura barroca. Estilo intermediário, o maneirismo é fruto de um período em que a mensagem, já quase Barroca, contrasta com a linguagem, que ainda é Clássica. Os grandes artífices desse estilo são precisamente Camões e Cervantes (este último mais que o primeiro), cujas obras, clássicas nos motivos e no código, já trazem no entanto embutidas aquela estranha mistura de alegria e desengano, que tão bem caracterizaria a cultura barroca.

Na verdade, o Renascimento em sua plenitude, entendido como império dos valores racionalistas, antropocentristas e humanistas, não existiu em verdade senão em algumas áreas da Europa – Itália, França, Holanda e Inglaterra –, ficando mais ou menos afastado de extensas terras onde não conseguiu, senão parcialmente, impor-se diante dos valores ibero-árabes e medievais.

“No caso português e espanhol, os descobrimentos marítimos levaram ao ápice de uma concepção triunfalista e messiânica da Coroa e da nobreza (rural e mercantil), concepção mais próxima de certos ideais césaro-papistas da alta Idade Média que da doutrina do príncipe burguês de Maquiavel. E durante todo o século XVI vincaram a cultura ibérica fortes traços arcaizantes, que a Contra-Reforma, a Companhia de Jesus e o malogro de Alcácer-Quibir viriam carregar ainda mais” (3).

É precisamente desse choque entre valores medievais, de um lado, e o novo pensamento antropocêntrico e racionalista veiculado pelo cinquecento, de outro, que tem origem a cultura barroca. É desse choque que advém a característica mais marcante do barroquismo: seu caráter paradoxal, oriundo da tentativa de conciliação de valores ideológicos opostos.

“Tipicamente seiscentista e meridional, orienta-se pelo empenho, frustre, de neutralizar e unificar a dualidade renascentista. Aliança identificadora entre o teocentrismo medieval e o antropocentrismo quinhentista, eis a geratriz fundamental do ideário barroco” (4).

Dessa reação às ambiguidades do período renascentista não podemos deduzir, porém, tratar-se o Barroco de mera tentativa de retorno aos valores do medievo. “A atmosfera do Barroco está saturada pela experiência do Renascentismo e herda formas de elocução maduras e crepusculares: o classicismo e o maneirismo” (5).

Barroco é o espírito que sintetiza toda uma época

Com efeito, trata-se aqui da tentativa de uma nova síntese que, incorporando os valores renascentistas, confira-lhes novo sentido, um sentido que é de esperança mas, ao mesmo tempo, de desengano diante das possibilidades de conciliação entre Fé e Razão.

O panorama político que dá suporte a essa visão de mundo está dominado pelos acontecimentos da Reforma e da Contra-Reforma. De fato, há todo um grupo de historiadores com destaque para Werner Weisbach, que ancoram na Contra-Reforma suas interpretações acerca do fenômeno do Barroco. Este último chega a afirmar, convicto, que o Barroco não é mais que criação deliberada do Concílio de Trento, concebido
“como um conclave para a revisão dos dogmas e para a consolidação da organização eclesiástica, mas também como um congresso destinado, sobretudo, a uma ampla revisão cultural, do qual resultaram (…) diretrizes que orientaram significativa parcela da criação e expansão cultural dos tempos seguintes” (6).

Tal proposta tem méritos, principalmente se levarmos em conta que no mesmo Concílio de Trento organizou-se a Companhia de Jesus, destacamento avançado da Contra-Reforma, e primeira porta-voz dos mecanismos metafóricos da arte barroca.

Mas a verdade é que a interpretação de Weisbach possui também limitações. Pois, se é fato que há visível consórcio entre os propósitos contra-reformistas e as possibilidades de fuga e fantasia enunciadas pelo Barroco, a verdade é que este último não se comporta nos limites das intenções políticas de Roma. Principalmente se anotarmos que é possível distinguir pelo menos dois tipos de barroco: um propriamente jesuítico, mais sóbrio e cauteloso; o outro, advindo tempos após, é mais afenso às efusividades e à magnificência que tão bem caracterizam o último Barroco – universalmente denominado “rococó”.

O fato é que, mais que instrumento da reação católica – com a qual se coaduna perfeitamente – o Barroco é o espírito que sintetiza toda uma época. Daí advém seu caráter polifacético, que obriga a interpretações que dêem conta de suas múltiplas conexões, do intrincado labirinto de fenômenos sociais com os quais dialoga e que configuram, em seu conjunto, o mundo pós-renascentista.
“Trata-se de um mundo já em defensiva, organicamente preso à Contra-Reforma e ao Império filipino, e em luta com as áreas liberais do protestantismo e do racionalismo crescente na Inglaterra, na Holanda e na França” (7).

Dentro da perspectiva da análise multifacética do Barroco, há que se destacar seus vínculos com o absolutismo dos novos estados mercantis. Nascido em plena Península Ibérica, provavelmente na região da Andaluzia, possivelmente em Portugal, o Barroco – conforme

BARROCO BRASILEIRO NA FRANÇA

A capital francesa será palco, na virada deste século, da maior exposição de arte brasileira já realizada no exterior.

Trata-se da mais completa mostra sobre o Barroco Brasileiro de todos os tempos. O evento – que ocorre de novembro de 1999 a fevereiro de 2000 – é organizado pelo Ministério da Cultura da França em homenagem aos 500 anos do descobrimento do Brasil.

A mostra contará com 350 peças expostas no Museu Petit Palais, um dos mais prestigiados da França. As obras virão de coleções particulares de sete estados brasileiros, do Pará ao Rio Grande do Sul.
A exposição, que reflete o crescente interesse pelo barroco brasileiro em várias partes do mundo, virá a São Paulo a partir de maio do ano que vem. Boa oportunidade para os que querem conhecer melhor o estilo oriundo do mundo ibero-árabe, que reflete em profundidade a essência da cultura brasileira. sustentam inúmeros historiadores – apresenta características que o vinculam no plano da expressão à opulência do absolutismo.

As referências ao absolutismo comparecem nos traços marcantes do Barroco, os quais – conforme enunciara o grande historiador da cultura Heinrich Wölfflin – estão na passagem da linearidade clássica ao pictórico, da superfície cartesiana à profundidade, da multiplicidade renascentista à unidade, da clareza total à clareza relativa, da forma fechada e reta à forma aberta e arredondada. Em suma, o caráter totalizante do Barroco contrasta com a fragmentação do classicismo. Tais características deixam entrever os nexos entre as formas de expressão Barrocas e as características do poder político que então se estabelece.

“Se, na estruturação do poder estatal (…) que então se fixa, tais caracteres são essenciais, integrando-se na própria pessoa do governante, as formas barrocas compõem-se em movimento contínuo para significar a aspiração ao infinito, que se contém na noção de ilimitação do mando soberano, enquanto o esplendor formal do Barroco traduziria, de forma explícita e direta, a expansão do poder na existência humana, onde se projeta com força incontrastada, criando uma beleza impositiva e superior” (8).

Produto ativo do mundo que irrompe com o fim da Idade Média, o Barroco mantém nexos com os múltiplos aspectos da realidade que mimetiza, sejam eles econômicos, políticos ou culturais. Embora seja de fato efeito e não causa dos processos sociais com os quais se vincula, importa-nos compreender a cultura barroca não apenas como mera expressão passiva do Seiscentos, mas como complexo ideológico apto a exercer interferência catalizadora na atividade real dos homens de sua época.

“(…) Impunha compreender tais valores – legítimos produtos sociais supra-estruturais, “ideológicos” – como possuindo, uma vez criados, uma vitalidade própria, o que os capacitava a participarem, como elementos ativos, do processo de integração e adequação” (9).

Ponderando que por ora interessam-nos apenas alguns traços gerais do estilo e da época do Barroco, nos furtaremos a apresentar outros aspectos sócio-econômicos e políticos que, integrando o novelo de determinações do barroquismo, são também por ele influenciados. Apenas a título de nota, influência decisiva para o estabelecimento desse “novo método de pensar e sentir” são os acontecimentos da expansão ultramarina e do estabelecimento do sistema colonial. Mas, de qualquer forma, isso por si só já daria matéria para um outro trabalho, razão pela qual não pretendemos ir aqui além desse registro e de algumas notas no item seguinte.

Para além disso, e já abordando aquilo que de fato nos interessa presentemente, entender a cultura barroca significa compreender as condicionantes culturais que atuam no período primordial da formação do povo brasileiro. É do estudo da cultura barroca que podemos depreender traços psicológicos comuns à nossa civilização, nascida sob o domínio de valores ibero-árabes que aqui adquiriram coloridos negros e indígenas, os quais, longe de amenizarem as nuanças barrocas de nosso comportamento, antes as acentuaram.

Aspectos gnoseológicos do barroco

Mas no que consistiriam essas nuanças barrocas que de forma tão profunda permeiam nossa personalidade coletiva de povo-nação? Para melhor entender essa questão, é necessário que passemos em revista algumas características marcantes da cultura barroca, bem como as formas pelas quais o homem barroco responde ao problema do conhecimento, isto é, ao problema da relação entre sujeito e objeto no processo de interação do Homem com a realidade.

Voltado para a conciliação dos valores opostos que marcam a cultura do cinquecento, o Barroco é antes de tudo um método para pensar a diferença. Diferença que é, primeiro, a dos valores antropocentristas e teocentristas, modernos e medievais; depois – o que teria influência decisiva na configuração do “último” Barroco – é a diferença entre os povos europeus e não-europeus, entre civilização cristã e paganismo – problema suscitado a partir do estabelecimento do sistema colonial.

No pensamento barroco, a diferença é vista como coisa a ser neutralizada, integrada compulsoriamente num todo perfeito e uno ou, na impossibilidade disso, simplesmente dissimulada. Tal pensamento serviu de substrato ideológico à nossa colonização de tipo ibérico, a qual teve na mestiçagem sua principal conseqüência sócio-cultural e na unidade nacional seu principal fundamento sócio político.

O contrário foi o que sucedeu ao norte. Ali, a cultura gótica que serviu de base ao modelo de colonização admitia a diferença e rejeitava a alternativa de mestiçagem.
“Os ingleses…empenhados em outro gênero de colonização, sua tarefa era a de transplantar sua paisagem mundo afora, recriando pequenas Inglaterras desatentos ou indiferentes ao que havia aonde chegaram” (10).

Ao compararmos os dois gêneros de colonização as diferenças ficam bem salientadas:
“Um é a tolerância soberba e orgulhosa dos que se sabem diferentes e assim querem permanecer. Outro é a tolerância opressiva, de quem quer conviver reinando sobre as almas e os corpos dos nativos (…) porque toda diferença lhe é intolerável” (11).

A essência da cultura barroca está na contradição, no intercâmbio permanente entre pólos opostos de uma mesma realidade, visando precisamente a ocultar as dualidades

Como acentua Darcy Ribeiro, o grande produto do modelo lusitano de colonização foi
“(…) um povo-nação, aqui plasmado principalmente pela mestiçagem, que se multiplica prodigiosamente como uma morena humanidade em flor, à espera de seu destino. Claro destino, singelo, de simplesmente ser, entre os povos, e de existir para si mesmos”. ( 12)

Claro está que o método barroco de tratar a ferro e fogo a diferença, buscando a qualquer custo forjar a unidade onde quer que perceba a diversidade, legou-nos, a nós brasileiros, imprevisíveis consequências do ponto de vista de nossa formação social. Dentre essas conseqüências destacaremos, em seguida, aspectos dos quais a alma coletiva dos brasileiros se encontra tão profundamente embebida.

A essência da cultura barroca está na contradição – no intercâmbio permanente entre pólos antinômicos, no trânsito entre fatores opostos de uma mesma realidade – visando precisamente a dissimular as dualidades, forjando artificialmente a unidade através de truques, enigmas e analogias sensoriais.

A contradição fundamental em torno da qual giram os dilemas barrocos é a dualidade Fé-Razão, ou Fé-Paganismo. Dessa antinomia básica deriva todo o perfil ambíguo da cultura barroca, perfil do qual a alma brasileira encontra-se tão profundamente impregnada, a ponto de Darcy Ribeiro chegar a ver nisso conseqüências para o modelo de estruturação de classes que vige em nosso país:
“Tal é a força dessa ideologia que ainda hoje ela impera, sobranceira. Faz a cabeça do senhorio classista convencido de que orienta e civiliza seus serviçais, forçando-os a superar sua preguiça inata para viverem vidas mais fecundas e mais lucrativas. Faz, também, a cabeça dos oprimidos, que aprendem a ver a ordem social como sagrada” (13).

De fato, a cosmovisão da gente brasileira assenta-se sobre tais princípios, tão bem sintetizados abaixo por Massaud Moisés:
“O espírito tende a ser considerado matéria, e a carne, a transcendentalizar-se: corpo e alma coligados inseparavelmente…tesão entre razão e fé, entre misticismo e erotismo, entre o gozo dionisíaco de viver e a morte com seus mistérios, entre a ordem e a aventura, entre a sensação de miséria da carne e de bem-aventurança do espírito, entre racionalidade e irracionalidade, etc. Estética das oscilações, das dualidades, dos conflitos, dos paradoxos, dos contrastes, das antinomias, que lutam por equilibrar-se e unificar-se, o Barroco assenta numa cosmovisão que pressupõe análoga teoria do conhecimento” (14). No que consistiria a “teoria do conhecimento” aludida? Essa teoria constitui-se das formas pelas quais o pensamento barroco responde ao problema fundamental do conhecimento, qual seja o problema da relação de conhecimento entre sujeito e objeto.

De duas formas responde o Barroco a essa problemática. A primeira delas pretende situar no próprio objeto o pólo fundamental da atividade cognitiva. Essa resposta, de teor desde já visivelmente empírico, concebe o conhecimento a partir da exploração dos aspectos externos do objeto, entendido como complexo de atributos plásticos, sejam eles sonoros ou visuais.

Tal vertente recebe ora o nome de gongorismo – porquanto foi o grande poeta andaluz Gôngora quem lhe deu celebridade –, ora o de cultismo. Vêm dessa concepção gnoseológica as práticas mais fantasiosas e delirantes do Barroco – tanto na literatura quanto nas artes visuais – práticas que consistem no mais das vezes na efusividade e no imenso tráfico de significantes, de forma a secundarizar seus significados. O objetivo de tais procedimentos é o de formar jogos com elementos de léxico semelhante e significado discrepante. Assim, o cultismo usa e abusa das figuras de linguagem: metáforas, metonímias, silepses, elisões, gradações, ecos e, principalmente, antíteses.

O intuito que o gongorismo materializa com muita eficiência é o de transcendentalizar o mundo, quebrar a vigilância racional do sujeito, direcionando sua atenção para truques embriagantes que pretendem atestar os muitos mistérios do mundo e sua impossibilidade de racionalização plena. No Brasil, os grandes representantes dessa vertente são o baiano Manuel Botelho de Oliveira e os artífices do último barroco brasileiro, o mineiro, particularmente Manuel da Costa Athaíde e Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.

A outra forma de trato do problema do conhecimento registrada na cultura barroca recebe o nome de conceptismo. Tal corrente assenta-se na primazia do sujeito e da razão no processo do conhecimento – isto é, na convicção de que a realidade se conhece por mecanismos silogísticos. O conceptismo é primo do racionalismo cartesiano e filho da sofística grega, de quem herdou em última instância as técnicas de retórica.

Os adeptos do conceptismo se valem do torneamento, da agudeza dos conceitos, buscam arrebatar as consciências não pela força do ritmo ou das rimas (o que porém está quase sempre presente), mas, antes disso, pelo bate-rebate dos conceitos, expostos num vai-e-vem pendular que inebria os espíritos atentos e convence-os de que o caminho que percorrem aquelas idéias é o da verdade. Da mesma forma que o gongorismo, também vale-se de jogos e enigmas, mas estes têm aqui caráter lógico-racional, não existem sob o aspecto das formas externas, sendo perceptíveis apenas pelo pensamento.

No mundo, o mais célebre representante dessa corrente foi o também poeta andaluz Quevedo. No Brasil, destaque-se, essa corrente possui um representante extremamente inovador: Padre Vieira. Funcionário da Companhia de Jesus, Vieira morou boa parte de sua vida na Bahia, escrevendo seus melhores sermões no Maranhão. A ele atribui-se uma teoria da oratória que teria influenciado muitos oradores sacros e poetas.

É necessário ressaltar que essas duas vertentes nem sempre aparecem na realidade da forma como aqui – por motivos de didática – acabamos de as expor. No mais das vezes convivem ambas as correntes dentro de um mesmo sujeito, sendo porém uma ou outra a predominante. É o caso do baiano Gregório de Matos, primeiro grande poeta nacional, o qual, embora cultive em muitos momentos o preciosismo formal e os extremos gongóricos, faz literatura de teor fortemente conceptista, no que foi influenciado até mesmo por Padre Vieira. (Continua na próxima edição de Princípios.)

* Jornalista e membro da direção nacional da União da Juventude Socialista (UJS).

Notas

(1) GIEDION, Siegfried. Space, Time and Architecture – The Growth of a new tradition. Cambridge (USA), The Harvard University Press, 1949. Apud MACHADO, Lourival Gomes. Barroco Mineiro, p. 73.
(2) ENGELS, Friedrich. A Dialética da Natureza, p. 15-16.
(3) BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira, p. 33.
(4) MOISÉS, Massaud. História da Literatura Brasileira, p. 66.
(5) BOSI, Alfredo. Op. cit., p. 34.
(6) MACHADO, Lourival Gomes. Op. cit., p. 45.
(7) BOSI, Alfredo. Op. Cit., p. 33.
(8) MACHADO, Lourival Gomes. Op. cit., p. 46.
(9) Id. Ibid, p. 66.
(10) RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro, p. 66.
(11) Id. Ibid, p. 70.
(12) Id. Ibid, p. 68.
(13) Id. Ibid, p. 72.
(14) MOISÉS, Massaud. Op. cit., p. 68.

EDIÇÃO 54, AGO/SET/OUT, 1999, PÁGINAS 66, 67, 68, 69, 70, 71