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    Barata

    Não sabe quando, mas um juramento ela fez: um dia irá à China, Laos, Camboja, Hong Kong ou alhures… para no interior daquelas inebriantes e intrigantes edificações, que só viu no cinema, mansamente sorver ópio e viajar infância a fora. Voltar à placenta. Tomar sorvete com seu primeiro namorado na tarde mais quente e seca […]

    Não sabe quando,
    mas um juramento ela fez:
    um dia irá à China,
    Laos, Camboja, Hong Kong
    ou alhures…
    para no interior daquelas
    inebriantes e intrigantes
    edificações,
    que só viu no cinema,
    mansamente sorver ópio
    e viajar infância a fora.
    Voltar à placenta.
    Tomar sorvete
    com seu primeiro namorado
    na tarde mais quente
    e seca de agosto.
    Deitar novamente
    no colo do pai,
    beijar novamente
    a mão do avô,
    chorar de novo
    aquela morte que a comoveu tanto.
    Roubar frutas,
    navegar em barquinhos de papel,
    feito um castor
    erguer barragens
    no curso das enxurradas.
    Novamente a primeira comunhão,
    cantar:
    Sim, irei ao altar do Senhor…
    Pura, pura,
    hóstia feito bala menta
    no céu da boca.

    Fisgada, lívida dor,
    imenso prazer,
    vez primavera.
    E zarpar para Plutão
    à velocidade da luz.
    Dar uma paradinha
    E ver de perto
    aquele vermelho de Marte
    e seguir infinito adentro…

    Ah! quisera ter ópio,
    tibetanas tragadas,
    naquela comprido cachimbo
    desde o ópio
    me trouxesse você aqui.
    Minha cabeça no seu colo,
    a sua paz,
    você ressonando
    sobre o meu peito… 

    mas não há cerveja,
    não há ópio,
    não há você
    e esta insônia,
    areia arranhando meus olhos.
    A companhia de ninguém,
    exceto
    de uma barata
    que se empanturra
    com o açúcar
    despejado num canto da casa
    armadilha que inventei
    para atraí-la.

    Verbos do Amor & Outros Versos – Adalberto Monteiro
    Goiânia – 1997

    Adalberto Monteiro, Jornalista e poeta. É da direção nacional do PCdoB. Presidente da Fundação Maurício Grabois. Editor da Revista Princípios. Publicou três livros de poemas: Os Sonhos e os Séculos(1991); Os Verbos do Amor &outros versos(1997) e As delícias do amargo & uma homenagem(2007).

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