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    Deste meu nome a uma árvore? Não é pouca coisa; embora não me resigne a ficar apenas sombra, ou tronco, abandonado num subúrbio. Eu o teu dei a um rio, a um longo incêndio, à minha parte cruel, à confiança sobre-humana com que falaste ao sapo que saiu do esgoto, sem horror ou pena ou […]

    POR: Eugenio Montale

    Deste meu nome a uma árvore? Não é pouca coisa;
    embora não me resigne a ficar apenas sombra, ou tronco,
    abandonado num subúrbio. Eu o teu
    dei a um rio, a um longo incêndio, à minha parte
    cruel, à confiança
    sobre-humana com que falaste ao sapo
    que saiu do esgoto, sem horror ou pena
    ou exaltação, ao alento daquele poderoso
    e suave lábio teu que consegue,
    nomeando, criar: sapo flores relva rocha –
    carvalho pronto a desfraldar-se sobre nós
    quando a chuva dispersa o pólen das carnosas
    pétalas de trevo e a chama se levanta.

    Se te compararam
    à raposa será pelo arremesso prodigioso
    de teu salto, pelo vôo de tua passada
    que une e que separa, que perturba
    e acalma as pedras da rua (o teu terraço,
    as ruas cerca do Cottolengo, o parque,
    a árvore que tem meu nome dele vibram
    felizes, úmidos e vencidos) – ou talvez só
    pelo onda luminosa que difundes
    das ternas amêndoas de teus olhos,
    pela astúcia de teus pasmos súbitos,
    pelo suplício
    de plumas laceradas que provoca
    tua mão de menina quando aperta;
    se te compararam
    a um carnívoro louro, ao gênio pérfido
    das matas (e por que não ao impuro peixe
    que dá choque, ao peixe elétrico?)
    é talvez porque os cegos não viram
    sobre as gráceis espáduas as asas,
    porque os cegos não viram o presságio
    da tua fronte incandescente, o sulco
    que aí com o sangue risquei, cruz crisma
    bruxedo sorte voto vale
    perdição e salvação; se não souberam
    crer-te mais que doninha ou dona,
    com quem dividirei minha descoberta,
    onde sepultarei o ouro que trago,
    onde a brasa que estridula em mim se,
    deixando-me, te voltas da escada?

     

    Eugenio Montale Poesias
    Seleção, tradução e notas de Geraldo Holanda Cavalcanti
    Prefácio de Luciana Stegagno Picchio
    Editora Record – Edição Bilíngüe, 1997

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