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    Comunicação

    Poema de circunstância

    à frente do corpo havia um mudo mundo parado dentro do copo de iogurte oferecido feito oferenda ao morto negro que já não sonhava certamente (embora adjetivos desse tipo estejam tão fora do atual padrão poético) eu não morri (embora carregue comigo a cicatriz de Ulisses) entrevistei meu assassino mas ele não quis falar disse […]

    POR: Alexandre Pilati

    à frente do corpo
    havia um mudo
    mundo parado
    dentro do copo
    de iogurte
    oferecido
    feito oferenda
    ao morto negro
    que já não sonhava
    certamente
    (embora adjetivos desse tipo estejam tão fora do atual padrão poético)
    eu não morri
    (embora carregue comigo a cicatriz de Ulisses)
    entrevistei meu
    assassino
    mas ele não quis falar
    disse que não iria falar
    pra a máquina de moer
    gente e não disse nada
    corpo caído em frangalhos
    sem colchão
    deliberadamente
    (sem dor ou barulhos
    em silêncio a dor bateu
    no paralelepípedo
    em forma de estilete
    em forma de estilingue
    paulada no coco
    que se descasca no cascalho
     – eu preciso falar mais
    falar mais um pouco
    mais um pouco falar
    mas o anteparo me desampara
    – ele não quis falar
    a bala gritou algo
    talvez mentiroso
    em minha mente
    como a chupeta
    que virava flor
    na menina
    boca de meu assassino)
    e fomos quietos
    para sempre
    inevitavelmente
    sirenes sereias
    nadaram no convés
    do camburão
    o mar da madrugada
    o silêncio do país

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