Banqueiros europeus sabotam a União Bancária

Não aceitam ser fiscalizados por uma autoridade européia

“Agora podemos e devemos agir em direção à União Bancária”, declarou o presidente da Comissão Européia (órgão executivo da União Européia), José Manuel Barroso Durão. Rápido acordo busca, também, o presidente do Conselho Europeu, Herman van Rompuy. A tradicionalmente lenta União Européia ordenou cumprimento de horas extras de trabalho aos seus burocratas para seja concluído o projeto da União Bancária.

Para os que traçam as políticas, isto constitui o primeiro passo para as metas de união política e de união fiscal. Metas consideradas exequíveis, somente, em horizonte de década. E embora os europeus estejam pressionados até asfixia pelo governo de Washington , assim como os países emergentes restaurarem definitivamente a confiança ao seu sistema bancário, aqueles que não vêem com bons olhos a idéia da União Bancária não são outros do que os próprios banqueiros.

O setor mina no ato o projeto, enquanto, ao invés de mover-se em direção à União Bancária, anula dias após dia qualquer progresso que tem sido feito desde o lançamento do euro até hoje.

Papéis de caráter “reservado” que circulam entre as autoridades européias tendo em vista a Reunião de Cúpula que começa nesta quinta-feira, aqui, em Bruxelas, mostram que a Comissão Européia já tem definido os vetores básicos de sua proposta sobre a feição que deverá assumir a União Bancária.

Especificamente, propõe que o setor bancário europeu inteiro seja submetido à fiscalização de uma autoridade central. Todos os bancos europeus serão submetidos a um código comum de cânones e, em troca, desfrutarão da cobertura de uma esquema único de garantia dos depósitos.

Negócios congelados

Há um ano, pelo menos, autoridades dos EUA e do Fundo Monetário Internacional (FMI) advertiram que “a crise do euro não poderá ser solucionada sem o enfrentamento dos problemas do sistema bancário e a reconstituição da confiança”. E o projeto da Comissão Européia está concentrado, exatamente, nestes pontos.

Especificamente, com a criação de uma autoridade fiscalizadora comum, serão enfrentados problemas como aqueles que surgiram durante a crise financeira de 2008, com a derrocada do Fortis. A questão do banco belgo-holandês constituiu uma verdadeira dor de cabeça para a Europa, considerando que suas atividades interfronteiras dividiam os deveres e as responsabilidades entre governos diferentes. O mesmo problema enfrentaram as autoridades também com a mais recente derrocada do bancos franco-belga Dexia.

Além disso, com o plano comum de garantia dos depósitos, os europeus esperam eliminar o risco do pânico bancário e dos saques maciços, com o qual vive hoje grande parcela do sistema bancário. Embora, todos os governos europeus têm seus próprios esquemas de garantia dos depósitos, contudo, em alguns casos estes esquemas não inspiram a segurança exigível. O esquema espanhol, por exemplo não inspira confiança. Mas, também, para os demais países que necessitaram de pacotes de salvação, a dúvida das garantias que oferecem aos seus depositantes é justificada.

Assim, enquanto os burocratas de Bruxelas preparam a União Bancária, os próprios bancos movem-se, exatamente, em direção oposta. No mercado interbancário, os empréstimos interfronteiras estão congelados. Os bancos alemães e franceses já fecharam suas torneiras de empréstimos aos bancos italianos e espanhóis.

Ações subterrâneas

Os números falam por si só. Os empréstimos de bancos franceses para bancos espanhóis foram reduzidos em 34% no último trimestre do ano passado. Os bancos franceses reduziram sua exposição aos bancos italianos em 16%. Sinal de recuo já soou, também, no setor bancário alemão, o qual mostra que prefere a segurança que lhe oferece o mercado nacional. Os empréstimos alemães aos bancos italianos e espanhóis foi reduzido em 19% ano passado.

O resultado é que os bancos da periferia européia não têm fonte de financiamento além da liquidez barata que lhes empresta o Banco Central Europeu (BCE). Nos últimos seis meses, quando as preocupações do mercado sobre a Grécia e a Espanha aumentaram, os bancos italianos e espanhóis tornaram-se os mais importantes clientes para os baratos empréstimos com prazo de três anos que divide, generosamente, o BCE.

Contudo, ao invés de canalizar esta liquidez à economia real, financiando particulares e empresas, os banqueiros especuladores preferiram utilizá-la para adquirir mais e mais títulos estatais de seus governos. O círculo vicioso, em que o setor estatal contamina o sistema bancário, e vice-versa, é mantido eternamente.

“O que se vê agora, é que os bancos europeus estão dispostos a assumir, somente, risco local. Observa-se até o contrário da união dos mercados financeiros. E enquanto isto continuar, será muito difícil retornar à normalidade”, explica Alberto Gallo, analista-estratégico do Royal Bank of Scotland no jornal The New York Times.

Figuras de proa do mercado advertem que aquilo que o sistema bancário europeu precisa agora é um claro plano que enfrentará eficazmente a crise de confiança. Não um documento de trabalho de algum burocrata de Bruxelas. De acordo com o predominante ponto de vista, a Europa precisa uma autoridade fiscalizadora central do setor bancário, cuja confiabilidade será inegociável. Muitos trazem como exemplo tudo aquilo que vigora nos EUA, onde existe uma autoridade bancária fiscalizadora central e um sistema comum de análise.

Até que ponto um sistema assim é aplicável na Europa será revelado em breve. No âmbito de salvação dos bancos espanhóis com empréstimos de 100 bilhões de euros, as autoridades européias exigem do governo espanhol que lhes entrega mesmo algum controle sobre o saneamento do setor. Obviamente, o governo espanhol recusa-se.

Quando o comissário de Competitividade da União Européia, Joaquin Almunia – um espanhol – declarou que pelo menos um dos bancos do país deverá fechar as portas, círculos políticos de Madri chegaram ao ponto de duvidar seu patriotismo.

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Fonte: Monitor Mercantil